Friday, February 23, 2007


À procura da batida perfeita II

Depois de já degustada toda a ressaca que se arrastou até esta última sexta-feira, falemos novamente (e sobriamente) sobre o Carnaval.

Como tudo o que acontece em nosso país, a festa mais esperada do ano é resultante das diferentes expressões culturais deste povo brasileiro miscigenado até a raiz. Samba, axé e frevo (e agora também o eletrônico, a bossa e até o samba-rock) são os ritmos que fazem multidões pularem horas contínuas sob calor intenso, chuva forte, com glamour ou na falta dele, seja qual for a cidade ou local.

É esta procura pela alegria, que beira o intocável ou indiscutível, a dedicação que move comunidades pobres e a excitação de blocos humanos que correm atrás de trios elétricos que me fizeram resgatar a vontade de participar novamente de uma festa de Carnaval. Queria lembrar o que até mesmo eu sentia e queria quando passava quatro ou cinco noites ininterruptas a pular num salão (não faz tanto tempo assim, mas a disposição, logicamente, não é a mesma).

Deixando de lado as razões óbvias - feriado, cerveja e sacanagem - que fazem com que muitos saiam às ruas em busca de qualquer tipo de folia, vejamos apenas a poesia presente no Carnaval.

No Rio de Janeiro, por exemplo, longe das clássicas escolas de samba e das majestosas alegorias da Marquês de Sapucaí, há os antigos (e também os novos) blocos de rua, como o famoso “Bola Preta”, cuja história se confunde com a da própria cidade, o “Boitatá”, muito conhecido pelas divertidas fantasias, a colorida “Banda de Ipanema”, o “Simpatia é Quase Amor”, o criativo “Imprensa que eu Gamo”, liderado por jornalistas, o descolado “Bangalafumenga”, entre muitos outros que saem uma ou até duas vezes para desfilar durante o feriado.

Tocando marchinhas antigas (os meus preferidos), as tradicionais canções de escolas de samba que já se tornaram domínio público, e o enredo próprio, todos contagiam pela alegria, dignidade e simplicidade com que fazem uma festa de grandes proporções, onde não se vê confusões ou arrastões. Os ‘tiozinhos-fera’, que comandam os blocos com seus chapéus de palha e pandeiros, são respeitáveis e recebem, democraticamente, um pouco de tudo: ricos, pobres, crianças, jovens, velhinhos, casais, casados, solteiros, gente feia, bonita, descolados, passistas e até mesmo gente que não sabe o que fazer com os pés.

De Santa Tereza ao Leblon, o Rio de Janeiro transforma-se num grande salão de baile que convida a pular a qualquer hora do dia. E, acredite, os melhores blocos saíam às 8h da manhã – uma boa estratégia de buzz marketing, primeiro, porque gera comentários e, segundo, porque aumenta as expectativas, uma vez que os responsáveis pelos blocos justificam as mudanças repentinas de horários como medida para diminuir o já elevado número de foliões.

E por todos os dias é este o espírito que toma conta da cidade, seus habitantes e turistas, que andam pelas ruas, cheios de adereços ou fantasiados, à procura da batida perfeita para o ritmo de seus corações. É possível ver muita gente serrar os olhos em lágrimas só de ver tanta empolgação (inclusive eu!).

O tal espírito do Carnaval, de fato, ameniza por poucos dias a violência e a desigualdade social (não extermina, é claro, pois uma colega que estava por perto teve seu celular furtado em meio a multidão), que castigam uma cidade maravilhosa e de encantos mil como o Rio. Há que se pensar para os próximos anos que o número de turistas e foliões só deverá crescer e que, simplesmente aumentar o policiamento não será o bastante. Caso contrário, quem perderá com isso será não somente o povo fluminense, como também o Brasil, que recebe anualmente na época, milhares de gringos.

Com certeza, acabem com tudo. Só não nos tire o tão esperado Carnaval.

“Quem não chora, não mama,
segura meu bem a chupeta.
Lugar quente é na cama,
Ou então, no Bola Preta!”

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